quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Notas do fim de dezembro


"Far from home, elephant gun"

Tempos a frente. 
O que mais se ouve no momento é que se sofre com a crise, mas as pessoas aqui parecem não sofrer.
Elas também vivem, mas parecem não viver.
Tudo aqui é tão correto que é desumano.
A artificialidade onipresente permeia tudo, desde os legumes no supermercado até o modo de agir das pessoas-máquinas. 
Enfim, cá estou, nesta cidade costurada com fios de eletricidade que desenham uma teia que aprisiona o tempo.
As horas e os dias parecem passar mais lentamente, sem pressa nenhuma para chegar ao amanhã que será igual o dia de hoje.
Programas de auditório, repetição sistemática de operações, não memória. Às vezes tenho um mal estar mental, tenho a sensação de estar na Invenção de Morel.
O ar frio do inverno parece aumentar minha solidão e melancolia, que permanece sem razão em mim.
Pelo menos sem um razão tangível.
O que sei é que se felicidade fosse ter, aqui seria o paraíso.
Mas aqui falta ser.
As pessoas são tão padronizadas e alienadas que parecem se diferenciar como dois carros iguais se diferenciam pelas placas.
Não há questionamento para nada.
Aqui, a vida parece fazer menos sentido.
Não que faça algum, mas aqui isto parece estar evidenciado.
Quando se preenche o vazio existencial com bens materiais, a vida também vira uma mercadoria, e para tudo o preço parece importar mais que os valores, distorcidos e corrompidos.
Extingue-se as necessidades básicas de sobrevivência e transforma-se as necessidades de vivência em um espetáculo ou num produto.
Falta-me algo.
Tudo aqui é belo (esteticamente), mas não é poético.




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