domingo, 29 de junho de 2008

Dois mil e nunca - fato #446

- Nossa conversa está tão agradável!
- Muito! Você não sabe o quanto tempo eu esperei para encontrar alguém como você na internet!
- Oh, eu é quem o diga!
- Posso só te perguntar uma coisa?
- Claro! O que quiser!
- Me diz, na verdade você é H ou M?
- Mulher.
- Entendo, mas na verdade quis perguntar: Humano ou Máquina?
- Ah claro, como pude ser tão insensata? Sou Máquina.


sábado, 28 de junho de 2008

Trânsito

Já estava há mais de meia hora dentro daquele ônibus que percorreu um percurso equivalente a dez minutos de caminhada.
Foi então que lhe ocorreu: quanto tempo já havia perdido parado no trânsito de São Paulo?
Sem hesitar, parou de escrever, fechou seu caderno e saiu do ônibus para ir andando.


sexta-feira, 13 de junho de 2008

Novamente, cada um com seus problemas


Vovó Zuleica, para parar de ir todos os dias ao bingo e se livrar deste vício, bebe até cair.

O grande sonho de Ademar é ganhar na loteria para reaver todo o dinheiro gasto com bilhetes da Mega-sena.

Hamilton é membro da Liga Revolucionária Bolchevique, veste camiseta vermelha com o rosto do Che Guevara, usa boina, é lider de um grupo comunista estudantil, mora com os pais empresários e tem um carro do ano que ganhou deles quando passou no vestibular.

Jesuíno teve uma infância feliz, tirando o fato de ter sido estuprado religiosamente todos os sábados por seu tio.

A bela Luísa, em alguns minutos, vai pular pela primeira vez de pára-quedas.
Mal ela sabe que Horácio, seu instrutor, quer se suicidar com uma mulher.

Chang, por não ter dinheiro suficiente, trabalha descalço na fábrica da Nike.

Para conseguir falar sem gaguejar nos encontros dos Alcoólicos Anônimos, Cristina bebe três doses de cachaça antes de cada reunião.

Disposta a emagrecer, Elaine corre dois quilômetros todos os dias e se hidrata com Coca-cola.
Coca-cola Zero, é claro.

Mergulhado em um dilema mortal, Alex não sabe se vai de jato ou de helicóptero para sua ilha particular.

Otávio diz ser um grande especialista em física quântica.
Autodidata, aprendeu tudo lendo livros de auto-ajuda.

Juvenal se masturba vendo livros de ciências da terceira série há mais de trinta anos.

Ingrid simulou sua própria morte, queimou sua casa, mudou de nome e saiu do país para fugir da obsessão de seu ex-namorado.

Raul passou no vestibular sem saber quantas guerras mundias tiveram.

Injustamente acusado de assassinar um cara, Pedro, fã de filmes de ação, matou todos os trinta e sete membros da organização criminosa que armou contra ele para provar que não matou ninguém.

Jessica leu numa revista que o vinho tinto trazia benefícios para a saúde e começou a usá-lo como substituto do leite na mamadeira de sua filha.

Deus é todo poderoso, mas precisa do dinheiro dos pobres.





Nota: todos os personagens deste texto são fictícios, qualquer semelhança com a realidade (não) é mera coincidência.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Uma pequena aula de História

Deus abençoe a América, gloriosa terra fundada pelos sábios homens brancos enviados dos céus.
É, todo mundo sabe que americano não é patriota só na copa do mundo.
Há casas em que colocam sim flâmulas nas janelas como nós estamos tão acostumados a ver nos filmes em que um bendito cidadão americano salva o mundo de perigosas forças do mal.
Há também toda aquela veneração fanático-religiosa dos homens estampados nas notas de dólar e toda a divinização dos founding fathers.
Acontece que os tais founding fathers não eram santos ou semideuses.
Eram homens.
Se eram sábios, nobres, valentes, honrados e já nasceram velhos, eu tenho lá minhas dúvidas.
Hoje, quero compartilhar com você, leitor deste blog, um pedaço da história de Seattle, a cidade do grunge, do Jimi Hendrix, do Space Needle e do festival da chuva (Seattle Rain Festival, 1st January to 31st December).
Começando do começo, fundar cidades naquela época em que índios e cowboys ainda eram de verdade era um negócio lucrativo.
É, portanto, de se imaginar que muitas cidades surgiram com este intuito.
Seattle foi uma delas e, assim como as outras, possui uma história de memoráveis batalhas, união e blablablá que é facilmente encontrada em livros.
Mas é claro, nunca as coisas são tão bonitas como nos livros.
Bom, a primeira cagada da história da cidade foi que escolheram um lugar que, além de ter um chão lamacento, chovia pra burro.
Imaginem que maravilha era construir uma casa num terreno desses e depois morar lá.
Ah, quase me esqueci.
Seattle é uma cidade costeira. Isso quer dizer nas duas vezes por dia em que a maré subia, esta, misturada com a lama e com os conteúdos das latrinas, uma vez que ainda não existiam privadas por lá, inundava as ruas e casas mais próximas da orla.
Era um lugar tão agradável que os fundadores até davam terrenos de graça para as pessoas irem morar lá.
Obviamente, com essa sujeira toda, tinha um monte de gente com cólera e outras doenças por ali.
Quem amenizou este problema foi um médico que, nos livros, está como "o cara".
De fato, ele curou muita gente.
Mas outro fato é que ele viu uma mulher gostosona doente e se empenhou para salvá-la com segundas intenções.
Quando ficou saudável, eles se casaram.
Detalhe: ele já era casado e ela tinha um marido que também estava doente. Não sei bem ao certo o motivo, mas sei que ele não conseguiu salvá-lo.
Não sei porquê.
Isso sem contar as brigas cotidianas com os índios, que em Seattle se amenizaram não com a dizimação, como era costume, mas com um acordo justo que se baseava no "ou vocês aceitam este pedacinho de terra que não é nem um terço do que a gente roubou mas que estamos gentilmente devolvendo e vocês não enchem mais o nosso saco ou a gente mata todo mundo."
Nisso, a cidade foi crescendo.
Até surgiu uma serralheria cujo dono era um canalha e quase faliu a cidade duas vezes por corrupção.
Ele até, com a consciência pesaaaada, organizou uma loteria para arrecadar dinheiro para a cidade.
Não preciso dizer quem foi o sortudo que ganhou, certo?
Continuando, depois que este nobre senhor abriu seu negócio, ele resolveu vender a serragem para colocar nas ruas, assim teria menos lama.
Só em teoria, claro.
A contribuição dele, na prática, fazia, duas vezes ao dia, as ruas terem rios de uma coisa que parecia granola.
Os mapas da época tinham os buracos das ruas maiores apontados. E eles até tinham nome.
Os jornais da época tinham manchetes como "menino de oito anos morre afogado no buraco x da rua tal."
E assim era Seattle até a chegada do vaso sanitário.
Ah, agora sim. Ao menos, as marés não vão trazer meu cocô de volta para casa. - pensavam ingenuamente os cidadãos.
O primeiro erro da instalação foi que os canos eram tosacamente feitos e pareciam caixas de madeira.
O segundo erro... bom, imagine o seguinte: Seattle tinha também uma parte alta que não molhava com as marés.
Quando a maré estava ok, as pessoas puxavam a descarga e era uma beleza.
Todavia, quando a maré subia, ela forçava o conteúdo dos canos de esgoto na direção oposta da qual ele deveria ir.
"Por sorte", a maré sozinha não tinha força o suficiente para forçar as privadas a vomitarem.
Acontece que quando a parte alta puxava a descarga nesta hora, a pressão dos canos, logicamente, aumentava e aumentava.
A pressão ficava tão alta que quando um cara na parte baixa puxava a descarga, uma espécie de geiser fétido explodia de seu vaso sanitário.
Pois é.
Sabe quando esta merda toda melhorou?
Quando um incêndio queimou boa parte da cidade.
Ironicamente, o incêndio foi uma das melhores coisas que aconteceram para Seattle.
Já que vamos ter de reconstruir tudo, vamos fazer direito desta vez. - pensavam ingenuamente os cidadãos.
Primeiro, construiram uma barragem para evitar que a maré invadisse a cidade.
Isso, pelo menos, eles fizeram direitinho.
Também decidiram elevar um pouco o nível das ruas, cobrindo com terra a parte lamacenta.
Como os negócios não podiam parar porque, afinal, tempo é dinheiro, muitas pessoas construiram casas e lojas em cima da lama sabendo que iam ser soterradas algumas semanas depois, havendo aí o surgimento de inovadoras construções de três andares em que todos os patamares possuíam uma porta para a rua.
Até aí, até que não é tão grave.
O grave foi que, além de subir o nível das ruas, decidiram asfaltá-las antes de começar a colocar terra.
Imagine os carros passando em uma estreita rua na qual, se você fizesse algo que hoje seria o equivalente a subir na guia, você mandava seu carro para uma queda de cerca de dois metros de altura, pousando suavamente onde haviam pessoas circulando.
E os transeuntes, por sua vez, para atravessar a rua, precisavam subir e descer escadas.
Aos poucos, foram nivelando a cidade até poderem construir a Seattle de verdade.
Nos subterrâneos, porém, ainda existem algumas construções deste período curioso da história da cidade, sendo possível visitá-las num passeio chamado Underground Tour, no qual os guias contam o lado podre da história que eu acabei de contar.
Hoje, acredito que Seattle seja uma das cidades em que as pessoas tem um senso crítico maior em relação ao resto dos Estados Unidos.
Não sei bem ao certo porquê, mas tem até uma estátua do Lênin lá.
É isso aí, do Lênin.
Acho que é por ter um pensamento um pouco mais aberto e crítico que eles liberaram estas informações, num passeio cultural irônico, sarcástico, de um humor auto-referencial.
Daí é de se pensar: é óbvio que não são só os
founding fathers de Seattle que eram seres humanos e que não é só esta cidade que tem seu lado sujo da história.
A esta altura do campeonato, contar o que se escondeu até agora seria uma iconoclastia, seria dar um soco no estômago do orgulho e queimar os heróis.
Falando em heróis, o Brasil tem algum além do Pelé?