quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Coincidência



Como definir a sensação que uma coincidência causa em nós?
Talvez uma espécie de susto com um sorriso com medo com dúvida com indignação com sorte com não, não é nada disso.
Mas para que definir, se não sou filósofo nem dicionário para me preocupar com isso? 
Não importa, não estou aqui para isto. 
O que importa é que antes, para mim, a coincidência era uma quimera de sete cabeças que me assombrava durante dias quando vinha pousar sobre minha sorte, mas hoje, depois de tantas visitas tão frequentes, já não estranho nem temo o bichinho. 
Afinal, nunca me fez mal algum e, pelo contrário, muitas vezes me trouxe muita sorte.
Assim como os antigos, que veneravam certas criaturas, considero esta como um sinal de bom agouro. 
O legal é que quanto mais gosto dela, mais ela aparece para mim.
Como disse, já não temo nem estranho a coincidência. Mas me surpreendo, é fato. 
Sempre me assusta, de tão inesperada sua chegada, mas logo penso "ah, é você de novo, danadinha!" e pego ela em minha mão para observá-la. 
Nunca consigo entedê-la, nunca consigo desvendá-la, até porque, uma das cabeças dela tem forma de esfinge.
Mas sempre adoro quando ela chega assim perto de mim. Tão bela, tão poética, tão misteriosa, tão poderosa que é o bichinho.
Mas tão de súbito ela vem, sem aviso ela se vai, sem deixar rastros, sem deixar respostas, sem deixar nada além de uma poeira fina que quando respiro me dá um arrepiozinho.
E você deve estar se perguntando, e qual é a moral da história?
Nenhuma.
Não estou escrevendo com um objetivo, apenas estou escrevendo, porque a última visita que ela me fez acabou despertando em mim este desejo de escrever sobre ela.
Estava eu a reler Todos os Nomes, do Saramago, acompanhando passo a passo os dias do Sr. José, protagonista da história e quando chego ao, não se preocupe, não vou estragar o final, quando chego ao final, viro a última página e ali encontro uma nota fiscal meio apagada onde se lê "de Registro Civil das Pessoas Naturais". 
Uma notinha fiscal, nada de mais, se Sr. José não trabalhasse na Conservatória Geral do Registro Civil. 
Depois fui descobrir que minha mãe, por acaso, sem ter com que marcar as páginas, pegou o primeiro papel que estava ao alcance de suas mãos e havia usado aquele papel para marcar as páginas.
Podia ter sido qualquer outro papel, qualquer outra nota fiscal.
Coincidência.
Daí, maravilhado com isso, lembrei de outro livro.
Quando fui comprar Alice no País das Maravilhas e Alice Através do Espelho em inglês, fui à livraria numa quinta-feira.
Como não havia nenhum exemplar no estoque, o funcionário encomendou e disse para eu buscar o livro na terça-feira, dia que fui, comprei e comecei a ler.
Exatamente uma semana depois, numa terça-feira, acabei de ler os livros e fiquei sabendo que terça-feira era o dia da semana que Lewis Carrol, pseudônimo do autor, considerava como seu dia de sorte.
Coincidência.
Semana passada, minha mãe estava a falar que não conhecia muitos Vinícius, que não era um nome tão comum, e quando ouvi o nome, lembrei que na noite anterior havia sonhado com Vinícius de Moraes.
Coincidência.
E houve certa vez um outro sonho, em que fui atacado por três cachorros brancos grandes. Acordei aliviado, sabendo que não é todo dia que se vê três cachorros brancos grandes juntos em um mesmo lugar, até que algumas horas depois, um velho amigo de meu pai convida-nos para jantar em sua casa naquela noite e lá no quintal, o que havia?
Pois é, nem cheguei perto deles.
Coincidência.
Falando em amigos de meu pai, meu pai ficou anos sem ter notícias de um velho amigo, até que um dia ele pegou um caminho que nunca faz, sem motivo algum, e encontrou a esposa deste seu amigo. Naquele dia, fazia exatamente um ano que a mulher com quem ele se encontrou havia se tornado viúva.
Coincidência.
E se continuar a fazer uma retrospectiva então, vixi, a lista é grande.
Só para falar muito por cima das recentes deste último ano, limão, pés, Trianon, número quatro, valsas, uniforme, som estéreo, sem açúcar, apelidos de parentes, Clarice, casa brasileira, Angra, batatas e cervejas, FAU, retas, ondas, nomes e sobrenomes, sonhos, ligações, mensagens, música, telepatia, antepassados, desejos, cicatrizes, vidas, livros, e por aí vai.
Sinceramente, não se o que seria de minha vida sem a coincidência.
Selvagem, voa livre, enigmática como uma esfinge, silenciosa e manhosa como um gato. 
Bichinho bonito, essa coincidência.





Um comentário:

Anônimo disse...

22 de Janeiro.