domingo, 27 de dezembro de 2009

Doismiledez



O desejo do ano passado de um 2009 mais poético funcionou.
Então um 2010 ainda mais poético para todos os leitores deste blog!






Fechando um ano e começando outro da melhor maneira possível. 
Sem chororo, sem confusão, sem saudade, só alegria!
Yeah!

domingo, 29 de novembro de 2009

Viajando no ônibus - 3° divagação



Estou sem nada para ler, o que fazer?
Feche os olhos.
Respire fundo.
Isto.
Ouça o que há ao seu redor.
Pesque a conversa alheia.
É muito interessante. 
Uma viagem sonora, uma cacofonia, um palimpsesto nonsense.


Ô motorista, vai descer, abre a porta aí porque segundo a dialética negativa do Adorno, aquele professor filha da puta passa na Paulista, vê que coincidência? Além disso eu briguei com meu pai de novo, maldito governo, e depois encontrei ele na festa de ontem super bêbado e, desesperado porque perdi meu emprego, fiz minhas unhas num salão perto de casa no dia que choveu pra caralho. Falando nisso, quando eu era pequeno eu tava trampando lá no banco, mas eu tava meia calabreza e meia escarola e acabei voltando a pé por causa do cara que vem com a mesma roupa todo dia. É muito legal, tá no youtube, até tirei foto, ele teve filhos super cedo e não sei porquê todo mundo fala tanto no livro que tem piscina, quadra, cento e noventa e dois cavalos e vi em promoção nas casas bahia. Na hora eu não acreditei e gritei Deus do céu, que calor infernal é esse, eu te amo, quer que segure sua dívida externa com fritas?



quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Coincidência



Como definir a sensação que uma coincidência causa em nós?
Talvez uma espécie de susto com um sorriso com medo com dúvida com indignação com sorte com não, não é nada disso.
Mas para que definir, se não sou filósofo nem dicionário para me preocupar com isso? 
Não importa, não estou aqui para isto. 
O que importa é que antes, para mim, a coincidência era uma quimera de sete cabeças que me assombrava durante dias quando vinha pousar sobre minha sorte, mas hoje, depois de tantas visitas tão frequentes, já não estranho nem temo o bichinho. 
Afinal, nunca me fez mal algum e, pelo contrário, muitas vezes me trouxe muita sorte.
Assim como os antigos, que veneravam certas criaturas, considero esta como um sinal de bom agouro. 
O legal é que quanto mais gosto dela, mais ela aparece para mim.
Como disse, já não temo nem estranho a coincidência. Mas me surpreendo, é fato. 
Sempre me assusta, de tão inesperada sua chegada, mas logo penso "ah, é você de novo, danadinha!" e pego ela em minha mão para observá-la. 
Nunca consigo entedê-la, nunca consigo desvendá-la, até porque, uma das cabeças dela tem forma de esfinge.
Mas sempre adoro quando ela chega assim perto de mim. Tão bela, tão poética, tão misteriosa, tão poderosa que é o bichinho.
Mas tão de súbito ela vem, sem aviso ela se vai, sem deixar rastros, sem deixar respostas, sem deixar nada além de uma poeira fina que quando respiro me dá um arrepiozinho.
E você deve estar se perguntando, e qual é a moral da história?
Nenhuma.
Não estou escrevendo com um objetivo, apenas estou escrevendo, porque a última visita que ela me fez acabou despertando em mim este desejo de escrever sobre ela.
Estava eu a reler Todos os Nomes, do Saramago, acompanhando passo a passo os dias do Sr. José, protagonista da história e quando chego ao, não se preocupe, não vou estragar o final, quando chego ao final, viro a última página e ali encontro uma nota fiscal meio apagada onde se lê "de Registro Civil das Pessoas Naturais". 
Uma notinha fiscal, nada de mais, se Sr. José não trabalhasse na Conservatória Geral do Registro Civil. 
Depois fui descobrir que minha mãe, por acaso, sem ter com que marcar as páginas, pegou o primeiro papel que estava ao alcance de suas mãos e havia usado aquele papel para marcar as páginas.
Podia ter sido qualquer outro papel, qualquer outra nota fiscal.
Coincidência.
Daí, maravilhado com isso, lembrei de outro livro.
Quando fui comprar Alice no País das Maravilhas e Alice Através do Espelho em inglês, fui à livraria numa quinta-feira.
Como não havia nenhum exemplar no estoque, o funcionário encomendou e disse para eu buscar o livro na terça-feira, dia que fui, comprei e comecei a ler.
Exatamente uma semana depois, numa terça-feira, acabei de ler os livros e fiquei sabendo que terça-feira era o dia da semana que Lewis Carrol, pseudônimo do autor, considerava como seu dia de sorte.
Coincidência.
Semana passada, minha mãe estava a falar que não conhecia muitos Vinícius, que não era um nome tão comum, e quando ouvi o nome, lembrei que na noite anterior havia sonhado com Vinícius de Moraes.
Coincidência.
E houve certa vez um outro sonho, em que fui atacado por três cachorros brancos grandes. Acordei aliviado, sabendo que não é todo dia que se vê três cachorros brancos grandes juntos em um mesmo lugar, até que algumas horas depois, um velho amigo de meu pai convida-nos para jantar em sua casa naquela noite e lá no quintal, o que havia?
Pois é, nem cheguei perto deles.
Coincidência.
Falando em amigos de meu pai, meu pai ficou anos sem ter notícias de um velho amigo, até que um dia ele pegou um caminho que nunca faz, sem motivo algum, e encontrou a esposa deste seu amigo. Naquele dia, fazia exatamente um ano que a mulher com quem ele se encontrou havia se tornado viúva.
Coincidência.
E se continuar a fazer uma retrospectiva então, vixi, a lista é grande.
Só para falar muito por cima das recentes deste último ano, limão, pés, Trianon, número quatro, valsas, uniforme, som estéreo, sem açúcar, apelidos de parentes, Clarice, casa brasileira, Angra, batatas e cervejas, FAU, retas, ondas, nomes e sobrenomes, sonhos, ligações, mensagens, música, telepatia, antepassados, desejos, cicatrizes, vidas, livros, e por aí vai.
Sinceramente, não se o que seria de minha vida sem a coincidência.
Selvagem, voa livre, enigmática como uma esfinge, silenciosa e manhosa como um gato. 
Bichinho bonito, essa coincidência.





terça-feira, 17 de novembro de 2009

A Bailarina



Procurando bem

Todo mundo tem pereba
Marca de bexiga ou vacina
E tem piriri, tem lombriga, tem ameba
Só a bailarina que não tem
E não tem coceira
Verruga nem frieira
Nem falta de maneira
Ela não tem



Vida de artista não é fácil.
Hoje passei por uma obra do metrô e vi uma moça pegando pesado na construção, levantando entulho para carregar um caminhão.
Dei uma boa olhada na bunda dela. Estava escrito Caterpillar.


Futucando bem
Todo mundo tem piolho
Ou tem cheiro de creolina
Todo mundo tem um irmão meio zarolho
Só a bailarina que não tem
Nem unha encardida
Nem dente com comida
Nem casca de ferida
Ela não tem



Lembrei então que conhecia a moça de um espetáculo, um dos melhores espetáculos de dança à que já assisti.
Moça grande, meio esquisita, com um braço só, mas um baita dum braço forte, filha do meio de mais de cem irmãs, nasceu bastante saudável e já com mais de duas toneladas.
Levou uma vida bastante difícil e, até onde sei, foi vendida pela família para trabalhar na construção em regime escravo.


Não livra ninguém
Todo mundo tem remela
Quando acorda às seis da matina
Teve escarlatina
Ou tem febre amarela
Só a bailarina que não tem
Medo de subir, gente
Medo de cair, gente
Medo de vertigem
Quem não tem


Até que um dia sua sorte mudou, e um bailarino da Cia. Beau Geste apaixonou-se pelos movimentos da pobre moça e convidou-a para rodar.
Foi então que a conheci.


Confessando bem
Todo mundo faz pecado
Logo assim que a missa termina
Todo mundo tem um primeiro namorado
Só a bailarina que não tem
Sujo atrás da orelha
Bigode de groselha
Calcinha um pouco velha
Ela não tem


Na Virada Cultural deste ano, fui ao Anhangabaú assistir, ao lado do palco do Balé da Cidade, num cantinho ali, ao lindo balé do casal.
A Bela era a Fera, e naquela dança inusitada entre um homem e uma escavadeira, havia uma beleza inacreditável e indizível.


O padre também
Pode até ficar vermelho
Se o vento levanta a batina
Reparando bem, todo mundo tem pentelho
Só a bailarina que não tem
Sala sem mobília
Goteira na vasilha
Problema na família
Quem não tem


Uma dança delicada, sutil, e a escavadeira, que à primeira vista era um monstro, mostrou ser tão feminina quanto se pode ser naquela dança estranhamente romântica.
Mas foi isso, teve sua chance de brilhar uma vez no palco e receber calorosas palmas, para depois voltar para o anonimato da vida dura e comum.
Como a maioria dos artistas.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Bostejando novamente sobre a FAU



Na análise anterior, ative-me somente a ressaltar a insuperável poética inerente ao Edifício Vilanova Artigas, popularmente conhecido como o prédio da FAU. Peço desculpas àqueles que leram o texto escrito e publicado neste mesmo meio de expressão virtual em março deste ano, mas devo confessar que tal poética me comoveu tanto que, no momento de expressão de minhas impressões sobre tal colosso, acabei deixando que meus sentimentos de profunda admiração me fizessem omitir uma parte importantíssima que também é inerente à construção do modernista que dá nome à sua esplendorosa criação.
Tratando-se de uma faculdade, isto é, um local de ensino, de reflexão, de aprendizado, de amadurecimento, de questionamentos e de críticas, de arquitetura e urbanismo, nada mais didático que o próprio ambiente de formação refletir o objeto de aprendizado e o próprio ensino.
O calouro chega, ainda acostumado com as salas de aula de seu antigo colégio e cursinho, e vê a monumentalidade do edifício. Maravilhado com a plasticidade moderna, ele admira as rampas, os andares em patamares distintos, os espaços abertos, a honestidade do concreto armado. Tudo que o cerca é beleza e perfeição sob a luz do dia transpassando o gigantesco wafer que paira sobre sua cabeça, e a FAU certamente é o lugar mais bonito que há no mundo, com a melhor infra-estrutura e os melhores professores que dão as melhores aulas.
Com o passar do tempo, porém, o aluno, antes recém saído da adolescência, agora encara sua própria maturidade. Com o conteúdo aprendido graças à FAU, mas nem sempre ensinado por ela, com o convívio diário com os colegas, com os docentes e com o próprio edifício, ela aprimora o seu senso crítico, eleva seu nível de exigência e questiona e critica o sistema de ensino, os colegas, os professores e, obviamente, o próprio edifício.
É neste instante, então, que ele descobre o segredo por baixo do concreto armado.
Ele percebe a ilusão e a desilusão. 
Ele descobre a resposta como um arqueiro zen.
No início, havia um grande deslumbramento, uma grande admiração, uma grande expectativa.
Com o passar dos anos, a distância entre biblioteca e xerox, entre cantina e os banheiros sempre distantes que dificultam a vida daqueles cujas necessidades fisiológicas excretais e digestivas são urgentes começam a incomodar cada vez mais.
As rampas de acesso que não permitem cadeirantes circularem sozinhos, o elevador que não chega em todos os andares, a falta de segurança com guarda-corpos inapropriados, os domos de fibra de vidro mal pintados que descascam e deixam a água da chuva passearem pelas salas e aumentam o nível de decibéis para que os docentes parem a aula reprimidos pela natureza, a falta de planejamento acústico das salas de aula e estúdios, o teto de estalactites que pingam um líquido fétido cor de café sobre maquetes, roupas brancas, cabelos recém lavados, impressos caros, telas de notebooks e que se infiltram entre suas teclas, cada detalhe é friamente calculado para que o estudante de arquitetura saiba exatamente o que não fazer.
A FAU não lhe dá as respostas de que caminho seguir, ela dá a liberdade para o aluno traçar seu próprio rumo, apenas alertando-o do que não deve ser feito, e isto se esconde debaixo do concreto armado do prédio, milimetricamente calculado para que um vento gelado sopre nos dias de frio e para que nos dias de calor, não haja circulação de ar.
E os professores também colaboram. Secretamente, alguns deles, por incrível que pareça, os mais odiados pelos graduandos, recebem um treinamento com mestres Jedi dos cantos mais distantes das galáxias inacessíveis, para que eles não dêem o conhecimento de mão beijada. Eles são instruídos a dar uma aula bem ruim, e cobrar resultados humanamente impossíveis, de forma que cada aluno tenha de buscar o conhecimento por conta própria.
Esta é mais uma característica inerente ao glorioso impávido colosso.
O tudo tudificador que potencializa as potencialidades socio-ambientais que permeiam seu interior e seu entorno ensina os caminhos a não seguir para que o aprendiz saiba aonde ir, é a tese e a antítese, o yin e o yang, o equilíbrio do universo.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Sinais de 2012



Sim, o fim do mundo está próximo!
Que calendário maia o que, à merda com as profecias.
É só ver ao seu redor.

Gzéntsy, o Mackenzie tá fazendo propaganda no Orkutsy!
É tão legal! Eu abri meu perfil lindoso e vi lá no cantsinho direito, o Mzão do Mackenzie e Educação e Cidadania desde 1870!
Que fashion, gzéntsi, acho que vou fazer!
Bem melhor que ficar lá na usp, não tem moda e só tem aquele bando de maconheiro barbudo vagabundo que não toma banho nem faz compras na Daslu!
Ui!








comentário pessoal: putaqueopariu

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Nonsense...?



Um sonho. 
Um sonho branco. 
Branco como a lua. 
Branco como o leite. 
Branco como a neve...
Branco como um elefante branco. Ponto.
Um sonho branco.
Foi um sonho branco que me despertou para a realidade.
Uma realidade colorida, com todas as cores que juntas formam o branco que de todas as cores é formado e que juntas formam o branco.
Foi um sonho que me despertou para uma realidade em que tudo me parece um sonho, mas a realidade é que é inacreditável.
Uma realidade deitada sobre uma rede macia de coincidências e absurdos e toda coincidência é um absurdo, mas o que não é absurdo ou mais absurdo que a realidade?
Eu gosto do absurdo.
Gosto de usar a imaginação a favor das palavras e vice e versa.
Mas talvez não seja preciso palavras tampouco imaginação para assistir a uma retroescavadeira dançar balé de maneira tão leve, delicada e feminina.
Não, certamente não é preciso.
Assim como não é preciso Lucy para haver Sky with Diamonds, também não é preciso pergunta para haver Because, nem é preciso ter sangue no álcool para conversar horas sobre uma cowgirl capadora de anões.
Não é preciso ser criança para brincar de bichinhos nem ser surrealista para desenhar vacas voadoras e muito menos ser biólogo para descobrir joaninhas sangue-sugas. 
Quem dirá então fazer música sem som e improvisar um dueto na clave muda, é claro que isto também é perfeitamente possível.
Se tartarugas podem ser pombos-correio, por que não?
Se é possível luzes serem sólidas e fogo um líquido que corre nas veias, se é possível madeiras se teletransportarem e suco de pêssego brotar da pele, então tudo é possível. 
Sim, tudo é possível.
Posso me ferir e ver a cicatriz em outro corpo, posso assistir um coração valsear, posso ouvir minha voz em som stereo sem artifícios tecnológicos, posso ter anteninhas, quatro braços e oito dedos no futuro e perceber assim que o número quatro me persegue.
Já vi gente destruir um poste com um beijo e acordar na mesma noite com um canto de um galo em plena metrópole e no mesmo recinto acordar ao lado de uma tartaruga laranja que não voa sendo que seu reflexo acorda ao lado de um peixe azul.
Azul e laranja que são cores complementares que me lembram no final o branco do sonho.
Um sonho branco.
Um sonho branco que me tornou fluente na língua do olhar.
Agora o abrir e fechar das pálpebras substituem o abrir e fechar da boca.
Um fio invisível amarra as cavernas entre as íris e se podemos conversar, porque não beijar com os olhos?
Um beijo úmido, tão molhado e intenso que uma lágrima escorre da boca dos olhos até a boca boca. 
Bocas bocas que suspiram de saudade que na realidade não é uma questão de tempo, mas de distância.
E se nada disso fizer sentido nenhum, não tem problema algum.
O amor é seu próprio sentido.



terça-feira, 20 de outubro de 2009

Dois mil e nunca - fato #31



- Essa pinta aqui te faz tão sexy...
- Obrigada, mas isso não é uma pinta.
- Como assim? Então é o que?
- Um pixel.



quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O tempo passa, o tempo voa

e a poupança Bamerindus continua numa boa!

Sou da época em que tubaína não era vintage e era comprada com cruzeiro no buteco da esquina que vendia Miranda e guaraná Taí em garrafas feitas de vidro, como as bolinhas de gude que não eram decoração, mas um esporte nacional como Gogos, só não mais importantes que bater figurinhas, rapar tazos e ver o Senna estourar champanhe no pódio que por sua vez não era mais importante que o futebol que ainda tinha Tafarel e Bebeto ganhando copas do mundo, tudo acompanhado pela tevê que não era digital, não era a cabo nem a satélite, não era plana nem plasma, era um tubo de raios catódicos disfarçado de cubo com a tela curvada para fora onde figuras bizarrézimas como Vovó Mafalda e Fofão entretiam a criançada de manhã, que também gostava de adivinhar em que porta escondia o monstro no programa do Sérgio Mallandro, que não era mais estranho que quatro tartarugas ninja falantes com nomes de gênios renascentistas italianos viciadas em pizza treinadas por um rato gigante de kimono lutarem contra um rinoceronte e um porco que trabalhavam para um chiclete mastigado dentro de um robô de cueca vermelha, mostrinho que só não era mais serelepe que os vilões de isopor e resina facilmente transformados em faíscas pela Espada Olímpica de Jiraya, japa que só não era mais legal que o Jaspion, que tinha cabelo igual ao que mamãe usava para combinar com jaquetas de couro, camisetas largas e calças acima do umbigo que eram a última moda descolada, como podíamos ver na MTV que passava, pasme, clipes musicais como Black or White, com Michael Jackson ainda vivo e que também aparecia Macaulay Culkin, que ainda era uma criança que não usava drogas e aparecia em filmes de Sessão da Tarde, junto com Lagoa Azul, filmes de cachorro, de pimpolhos ninjas e Robocop, mas eu estou falando do Robocop durão, não o Robocop Gay da música dos Mamonas Assassinas, que falando neles, meu pai tinha uma Brasília Amarela que foi trocada mais tarde por um Opala prateado, carrão estiloso para macho, já que direção hidráulica e terceira marcha era coisa de boiola que nem o Freddy Mercury, que deixou saudades assim como Renato Russo, e os dois faziam música em uma época em que música de rebolar era dançada pela Carla Perez, teclado ainda tinha som de teclado e música de video-game ainda tinha som de música de video-game, que só rodavam se a gente soprava o cartucho, mas quando rodavam era uma maravilha passar a tarde correndo com um porco espinho azul, crescendo com cogumelos e dando hadouken em personagens étnicos como um brutamontes russo, e os russos eram sempre os vilões dos filmes que queriam dominar o mundo, e eu nunca entendia o porquê, mas adorava ver o clichê de o mocinho desativar a bomba quando faltava um segundo para tudo ir pelos ares, era sempre uma surpresa, apesar de prevista, como o Kinder Ovo, que custava só 1 real, e tinha o slogan "um chocolate, um brinquedo e uma surpresa", que minha mãe ou meu pai compravam às vezes, trazendo de metrô quando a linha verde ia só até a estação Clínicas e quando ainda não dava para ligar no celular pedindo um ovinho porque celulares ainda não existiam e portanto não tiravam fotos, pois esta era uma atividade restrita às câmeras de filme que não eram coisa de profissional, era coisa de um amador qualquer, ao contrário dos computadores, que estavam começando a ficar populares e a internet era novidade, lerda e discada, que servia basicamente para conversar no icq, era tudo tão lerdo que nem corrente dava para mandar, isso era feito pelo correio, que ainda tinha várias caixinhas amarelas no meio da rua para você deixar cartas, e na rua as pessoas andavam sem iPod, mas com Walkman, que funcionava com fitas cassete, menorzinhas que a dos filmes das videolocadoras que tinha um montão em cada esquina, mas que tinhamos de rebobinar antes de devolver ou de assistir, como quando a gente gravava um programa na tevê, e eu gostava de assistir As aventuras de Tin Tin, Família Dinossauro, Tv Colosso e Cavaleiros do Zodíaco, e desses eu tinha até os bonequinhos de armadura, que devem estar guardados empoeirados em algum lugar junto com meus bloquinhos de Pequeno Engenheiro, meus Playmobils, minhas fichas de fliperama, meu baldinho de Lego, que ainda não tinha engrenagens complexas, e meus carrinhos de fricção, atrás dos quais eu corria com meus tênis que acendiam luzinhas ou com meu Kichute sem me preocupar com política numa época em que o Lula comia PF nem dar a mínima se o mundo iria acabar no ano 2000 com o bug do milênio ou com a invasão alienígena do ET de Varginha. 
Mas isto tudo, meu jovem, é coisa do milênio passado.



quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A Liberdade


Não tenho mais reservas alimentares disponíveis e saboreio meu último chocolate derretido com o calor ambiente até o último instante. O prazer, porém, dura pouco, pois o açúcar me dá sede e logo me arrependo de perder minha batalha contra a fome. Relutante, admiro o último gole de água que resta em minha garrafinha de meio litro de água. Quero lutar contra meus impulsos, mas não consigo e esvazio a garrafa, virando-a até a última gota. Logo, terei vontade de urinar, mas não há banheiro algum nas proximidades e não posso nem ao menos me mover. Estou preso. Terei de aguentar até o último instante. Se eu sobreviver ao dia de hoje, começarei a sair de fraldas para evitar possíveis transtornos. Suo feito um porco, muito embora tenha descoberto que porcos não transpiram, suo muito com este calor infernal e sinto que vou perder a consciência. Mas não sou o único. Estou confinado junto a dezenas de desconhecidos que sofrem o mesmo que eu. Para poupar minhas energias, tento dormir um pouco, e consigo descansar até o sono se esgotar, e volto a me incomodar com este ar denso, rarefeito, com cheiro de gente e roupa úmida. Já perdi a noção do tempo há muito tempo preso aqui dentro. Para me distrair, releio Cortazár que comprei anteontem e li durante os percursos dentro de meios de transporte públicos. Termino de ler e sem mais nada para fazer, desembaço o vidro e vejo a chuva lá fora caindo sobre o teto de incontáveis autoimóveis, molhando a fronte de um único aglomerado de feras contraditoriamente concebidas para correr a pelo menos cem quilômetros por hora. Me chama a atenção uma van amarela da Sedex. Pode confiar. Rá, com este trânsito do caralho, tá bom. Olho o relógio e percebo então que já estou há quase duas horas de pé, cozendo em vapor humano, sendo que são apenas quatro quilômetros de distância entre meu ponto de partida e meu ponto de chegada, distância que eu conseguiria cobrir em cerca de cinquenta minutos de caminhada. Isto significa que já estaria lá há mais de uma hora e ainda teria me exercitado e estaria úmido de chuva, não de suor nostro. Puto da vida, saio, depois de me esgueirar pelas microfrestas entre anônimos braços, bundas e mochilas e irritar metade dos passageiros do busão. Ahhh! Enfim, livre! A chuva ácida de São Paulo é deliciosamente refrescante e purificadora. Benzido, inclino a cabeça para cima, respiro fundo, fecho os olhos, abro a boca e os braços. Um bem estar corre por meu corpo junto com a água que me lava e, com um sorriso no rosto, já não me incomodo com as calçadas inundadas e esburacadas, pois ando pelos estreitos corredores de autoimóveis rapidamente, cada vez mais veloz, ultrapassando um jetta, uma bmw, e mais para frente um porsche, e assim vou correndo livre, pisando fundo (nas poças d'água). 


terça-feira, 22 de setembro de 2009

Nota sobre o ensino - 3


As monocotiledôneas são um grupo de angiospérmicas cujo embrião tem, tipicamente, um só cotilédone, raiz fasciculada e folhas paralelinérveas, diferentemente das dicotiledôneas, cujo embrião possui dois ou mais cotilédones, raiz axial e folhas de nervação reticulada.
Contudo, apesar de suas contrastantes diferenças (ou quiçá graças a elas), ambas possuem a função comum de serem decoradas para se passar no vestibular.


sábado, 19 de setembro de 2009

Nota sobre o ensino - 2


Suponha que você está a bordo de um trem bala submarino a uma profundidade de 3,48 milhas no Oceano Índico. Considere que a água do mar é composta de 96,5% de H2O, 2,87% de NaCl e 0,63% de Coliformes Fecais de origem primata e a densidade pode ser calculada considerando que aproximadamente 1,2044 × 10
24 e moléculas de gás hidrogênio reagem com 6,022 × 1023 moléculas de gás oxigênio, formando 1,2044 × 1024 moléculas de água, a massa atômica do hidrogênio é de 1,00784u e a massa atômica do oxigênio é de 15,9994u, 1 mol de NaCl tem 58,5 gramas e os coliformes fecais não possuem massa. No instante t=0,44ms, o trem está a uma velocidade de 58,2km/m e possui uma aceleração de 95m/s. Considere o coeficiente de atrito com a água marinha sendo raiz quadrada de 0,87µ. Tendo estes dados, suponhamos que no instante t=4h21m43s o trem esteja emergindo na superfície do oceano e que o ar possua uma densidade de 1,21kg/m³ mas desconsidere a resistência do ar pois o trem, durante o percurso, mais precisamente no instante t=467m104s , atravessou um buraco de minhoca em uma dobra espacial e desembocou no oceano de Corot-7b, um exoplaneta onde a gravidade é raiz cúbica da Terra vezes 8,7 fatorial. Considere a gravidade da Terra como sendo de 9,80665m/s2
Visualizado o contexto com base nos dados acima, agora considere você respire em um ritmo constante num compasso de 17/8 em um andamento de 97. Considere também que você possua capacidade de respirar água, que seus pulmões possuam uma capacidade volumétrica de 4,79 litros e que você passe a respirar ar quando o trem no qual você está a bordo emerge na superfície do oceano do exoplaneta, cujo ar possui a mesma densidade da Terra mas é composto por 99,2% de urânio 238 e 0,08% de microscópicos alienígenas inteligentes com QI de 70π e suficientemente pequenos para que possam ser inspirados e cair na sua circulação sanguínea. Para simplificar os cálculos, considere que seu coração sofra mutação pelo urânio e que passe a bombear o sangue a uma pressão de 80mm/Hg.
Com base nestes dados, calcule, em números romanos, o quanto é importante resolver este problema e justifique sua resposta com contra argumentos em rimas alexandrinas.


quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Nota sobre o ensino - 1


Mesmo dizendo que este mundo afora é selvagem e competitivo, o fato é que ainda faltam muitos profissionais capacitados para exercerem suas funções com eficiência e competência.
Pensando nisto, vou colocar aqui um mini-curso profissionalizante, para que você possa ser um destes vencedores dignos de sua função. 
Deveras, não é preciso muito para exercer uma profissão como professor de design, seja de projeto visual ou de produto, mas o mercado carece de educadores competentes.
A metodologia é simples e você mesmo, que não tem experiência nenhuma, pode virar um.
Basta seguir as quatro etapas básicas listadas a seguir e você já está pronto para dar aulas.
  1. Basta mostrar que seu ego é grande, bem grandão, e inventar algum motivo de projeto que ninguém colocará em prática na vida real.
  2. Terminada esta primeira etapa, ministre umas duas ou três aulas teóricas baseadas em fontes completas e confiáveis, como a Wikipédia em português, e peça para que os alunos formem grupos.
  3. Daqui até a última aula, faça aulas atendimento e xingue os alunos, a mãe dos alunos e, se quiser e estiver inspirado, o trabalho dos alunos também. O principal motivo disto é que é terapêutico e você pode descontar suas carências e problemas pessoais neles. Não tenha medo de usar palavrões e xingue mesmo se achar que o trabalho está bom, pois isto estimula a produção deles e você pode fazer eles terem menos noites de sono, mesmo que em vão, até o último dia de aula.
  4. Por fim, a última etapa consiste em mostrar a toda a classe todos os trabalhos e dizer que nada está tão ruim assim. Sem ter medo de ser contraditório, diga-lhes que poderiam mudar isso ou aquilo, baseado, obviamente, nas idéias geniais que eles tiveram na primeira aula e que você descartou.
Seguindo este roteiro, você já está preparado para ser um professor de design. Para uma formação completa, há apenas mais dois lembretes. O primeiro é basear seu critério de avaliação no achei bonitinho ou não achei bonitinho. Os primeiros ganham uma nota aleatória entre 7,5 e 9,0 e os segundos entre 6,0 e 7,5. O segundo e último lembrete é passar todos os alunos, mesmo aqueles que não vieram nem fizeram nada, para evitar fadiga e cochichos sobre sua mãe e sua vida sexual nos corredores.

Nota: você não precisa complementar sua formação com um curso superior em design, pode imprimir esta página e assinar na linha abaixo, e isto serve como um certificado para exercer esta maravilhosa profissão, que não é regulamentada.


data: __/__/____
________________________
 assinatura           




sábado, 29 de agosto de 2009

O Labirinto


Mas como é que eu vim parar aqui?
Porra, de novo, de novo nesse lugar.
Desculpe, devo ter me perdido. O que? Ah, não, não, isso acontece com uma certa frequência, sabe como é né, uma idéia puxa a outra e no final, todas as idéias interessantes ficam em algum lugar que eu já nem me lembro mais.
Mas então, poderia me ajudar? Eu queria achar o caminho de volta. Eu ia escrever alguma outra coisa bem mais interessante que não esta daqui, mas comecei a viajar na maionese e, quando me dei conta, vim parar aqui.
Obrigado, muito gentil de sua parte. É só seguir por aqui, certo?

Mas como é que eu vim parar aqui?
Porra, de novo, de novo nesse lugar.
Desculpe, devo ter me perdido. O que? Ah, não, não, isso acontece com uma certa frequência, sabe como é né, uma idéia puxa a outra e no final, todas as idéias interessantes ficam em algum lugar que eu já nem me lembro mais.
Mas então, poderia me ajudar? Eu queria achar o caminho de volta. Eu ia escrever alguma outra coisa bem mais interessante que não esta daqui, mas comecei a viajar na maionese e, quando me dei conta, vim parar aqui.


Mas como é que eu vim parar aqui?
Porra, de novo, de novo nesse lugar.
Desculpe, devo ter me perdido. O que? Ah, não, não, isso acontece com uma certa frequência, sabe como é né, uma idéia puxa a outra e no final, todas as idéias interessantes ficam em algum lugar que eu já nem me lembro mais.
Mas então, poderia me ajudar? Eu queria achar o caminho de volta. Eu ia escrever alguma outra coisa bem mais interessante que não esta daqui, mas comecei a viajar na maionese e, quando me dei conta, vim parar aqui.


Mas como é que eu vim parar aqui?
Porra, de novo, de novo nesse lugar.
Desculpe, devo ter me perdido. O que? Ah, não, não, isso acontece com uma certa frequência, sabe como é né, uma idéia puxa a outra e no final, todas as idéias interessantes ficam em algum lugar que eu já nem me lembro mais.
Mas então, poderia me ajudar? Eu queria achar o caminho de volta. Eu ia escrever alguma outra coisa bem mais interessante que não esta daqui, mas comecei a viajar na maionese e, quando me dei conta, vim parar aqui.
Obrigado, muito gentil de sua parte. É só seguir por aqui, certo?

Mas como é que eu vim parar aqui?
Porra, de novo, de novo nesse lugar.
Desculpe, devo ter me perdido. O que? Ah, não, não, isso acontece com uma certa frequência, sabe como é né, uma idéia puxa a outra e no final, todas as idéias interessantes ficam em algum lugar que eu já nem me lembro mais.
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Mas como é que eu vim parar aqui?
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etc


sábado, 22 de agosto de 2009

Cenotáfio



Eis
um post

em homenagem
às idéias que morreram
anônimas ou que foram esquecidas
antes de conseguirem chegar aqui neste blog



sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Tortura literária para homens

*copiado do capítulo 130 do Jogo da Amarelinha, de Julio Cortázar


Riscos do fecho-éclair

O British Medical Journal informa sobre uma nova classe de acidente que as crianças podem sofrer. O mencionado acidente é provocado pelo uso do fecho-éclair em lugar de botões na braguilha das calças (escreve o nosso correspondente de medicina).
O risco consiste que o prepúcio fique preso pelo fecho. Já se registraram dois casos. Em ambos, foi preciso praticar a circuncisão para libertar o menino.
O acidente tem mais probabilidade de ocorrer quando a criança vai sozinha ao banheiro. Ao procurar ajudá-la, os pais podem piorar a situação, puxando o fecho no sentido contrário, por engano, pois o menino não se encontra em condições de explicar se o acidente se produziu ao puxar o fecho para cima ou para baixo. Se o menino já foi circuncidado, o dano pode ser muito mais grave.
O médico sugere que, cortando a parte inferior do fecho, com alicate ou tesoura, as duas metades podem ser facilmente separadas, Mas será necessário praticar uma anestesia local para retirar a parte incrustada na pele.




ouch



quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Pequenos incômodos do dia a dia - incômodo 2


Moro num país tropical, numa cidade de clima indefinível, num prédio de um bairro desta cidade que, assim como outros prédios, tem garagem no subsolo.
Com alguma frequência, desço de elevador para a garagem e ele pára no térreo, porque algum outro morador que deseja subir chamou o elevador quando eu estava descendo.
Sempre que isto acontece, o cidadão abre a porta do elevador, olha para mim, aguarda um momento para se certificar de que eu não vou descer no andar térreo em que ele se encontra e pergunta educadamente: "está descendo?" e eu respondo obviamente afirmativamente, e então a pessoa cordialmente solta a primeira porta que se fecha sozinha e esta aciona o fechamento da porta do elevador que, somente quando fechado novamente, continua sua jornada ao subsolo.
É claro, eu também por vezes sou o tal cidadão acima. Mas o fato é que todo este ritual me incomoda e eu, quando sou o condomino que se encontra no térreo, se vejo que o elevador está descendo, não aperto o botão, já que certamente ele está rumo à garagem, pois se ele fosse parar no térreo, o botão estaria aceso.
É claro, eu também por vezes aperto o botão por costume ou por distração. Mas o fato é que quando o elevador pára no térreo, eu entro mesmo sabendo que ele vai descer. Isto me poupa o trabalho de abrir a porta duas vezes e consequentemente me poupa o tempo de esperar as duas portas se fecharem duas vezes.
É claro, as pessoas que se encontram no elevador, ao me verem entrar, me avisam com solidariedade que o elevador está descendo, porque por algum motivo elas acham que não percebi e que prefiro esperar mais tempo no térreo e fazer todo o ritual das portas duplas.
O mais engraçado é que quando respondo que não há problema, que não me incomodo de passear um pouquinho de elevador, elas sorriem e acham que sou um cara bacana, daí fico sem graça de dizer que na verdade é uma questão de evitar paradas desnecessárias porque o elevador terá necessariamente de descer para depois subir novamente e sorrio hipocritamente de volta.
O lado bom é que um ou dois andares, do térreo ao primeiro ou segundo subsolo, não é o suficiente para precisar falar com os moradores deste prédio deste bairro sobre o clima indefinível desta cidade deste país tropical.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Notas do fim de dezembro


"Far from home, elephant gun"

Tempos a frente. 
O que mais se ouve no momento é que se sofre com a crise, mas as pessoas aqui parecem não sofrer.
Elas também vivem, mas parecem não viver.
Tudo aqui é tão correto que é desumano.
A artificialidade onipresente permeia tudo, desde os legumes no supermercado até o modo de agir das pessoas-máquinas. 
Enfim, cá estou, nesta cidade costurada com fios de eletricidade que desenham uma teia que aprisiona o tempo.
As horas e os dias parecem passar mais lentamente, sem pressa nenhuma para chegar ao amanhã que será igual o dia de hoje.
Programas de auditório, repetição sistemática de operações, não memória. Às vezes tenho um mal estar mental, tenho a sensação de estar na Invenção de Morel.
O ar frio do inverno parece aumentar minha solidão e melancolia, que permanece sem razão em mim.
Pelo menos sem um razão tangível.
O que sei é que se felicidade fosse ter, aqui seria o paraíso.
Mas aqui falta ser.
As pessoas são tão padronizadas e alienadas que parecem se diferenciar como dois carros iguais se diferenciam pelas placas.
Não há questionamento para nada.
Aqui, a vida parece fazer menos sentido.
Não que faça algum, mas aqui isto parece estar evidenciado.
Quando se preenche o vazio existencial com bens materiais, a vida também vira uma mercadoria, e para tudo o preço parece importar mais que os valores, distorcidos e corrompidos.
Extingue-se as necessidades básicas de sobrevivência e transforma-se as necessidades de vivência em um espetáculo ou num produto.
Falta-me algo.
Tudo aqui é belo (esteticamente), mas não é poético.




sexta-feira, 31 de julho de 2009

Pequenos incômodos do dia a dia - incômodo 1


Eu entendo que temos de respeitar os mais velhos, minha mamãe me ensinou isso muito bem.
Mas convenhamos: se o mundo fosse um lugar mais prático, os velhinhos subiriam depois no ônibus, não antes.
Claro, sim, eu sei, a melhor solução seria entrar por trás e pagar na saída pela frente, como em alguns países, mas descartando reformas no sistema de transporte público, porque além de utópico, tratando-se de São Paulo, é demorado, não é prático nem depende da gente, olha só, é só analisar os fatos:
Eles sobem devagar e ficam ali na frente. Os demais passageiros devem se movimentar para a parte pós-catraca do monstro geométrico urbano e, para isto, devem passar obrigatoriamente pela parte pré-catraca, onde se aglomeram os velhinhos. O resultado óbvio desta tradição é que os velhinhos atrapalham o fluxo de pessoas e ainda sofrem sendo esmagados por todos os passageiros que vão para a parte de trás.
Conclusão: todo mundo se fode.


terça-feira, 21 de julho de 2009

Por falta de palavra melhor...


Defina: Arte
Defina: Amor

Dois dissílabos de quatro letras iniciados pela letra A.
Dois signos criados para designar algo muito além do que é possível explicar.
Duas coisas que acompanham sempre a humanidade desde seus primórdios.
Duas coisas que estou em vão tentando definir já sabendo de antemão que são indefiníveis.
Duas palavras cujos significados não cabem em si.
Duas coisas que estão além da ação aparente, já que pintar é bem diferente de fazer arte e transar é bem diferente de fazer amor.
Duas coisas tão óbvias e tão complexas ao mesmo tempo.
Duas coisas que quebram os paradigmas, que nos faz quebrar os paradigmas.
Duas coisas que iluminam e confundem ao mesmo tempo.
Duas coisas que nos faz passar por loucos.
Duas coisas que movem os sonhadores e embelezam o mundo.

Chega.
Por que tentar rotular "o que não tem receita, não tem vergonha, não tem governo, não tem juízo. O que não tem limite. Nem nunca terá."?

Por falta de palavra melhor.








te amo









segunda-feira, 29 de junho de 2009

Sobre a Marginal Tietê


O resumão é o seguinte: estão ampliando a Marginal Tietê.
Os odiadores de trânsito estão felizes: o trânsito fluirá melhor.
Os construtores estão felizes também: há mais coisas para destruir para construir outra em cima.
As pessoinhas também estão felizes: o governo está preocupado com seu bem estar.
Os adoradores de árvores estão preocupados e sentidos: estão derrubando indefesas árvores centenárias para essa obra.

O resumão "impessoal" é esse, se quiser ler mais tem um monte de blogs verdes explicando tudo bem melhor, do tipo esse, esse outro, esse aqui que é pop e esse que é bonito e que não é um blog.

De qualquer modo, a versão não impessoal é a seguinte: o governo só caga e senta em cima e não sabe gastar bem o nosso dinheiro, o trânsito de São Paulo é uma merda, está mais que saturado, não vai ser uma faixinha a mais que vai resolver tudo e não sou um adorador de árvores, mas acho que derrubar essas árvores foi uma pena. Não pelo porte, mas porque não foi algo justificável.
Se o ponto é diminuir o trânsito, porque não fazem de um jeito que não estimule o uso dos automóveis, ao invés de facilitar o uso destes? Por que não pegar o dinheiro todo investido nessa obra para melhorar e ampliar a rede de transporte público? Por que não, ao invés de construir faixas para carros, construir ciclovias pela cidade? 
Ein, por que? 

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Cobertura da greve (das idéias)


Quer saber, vou mostrar quem é que manda aqui. 
Vou demitir uma idéia. Isso mesmo, vou demitir uma idéia.
E qualquer outra que se rebelar vai ver.
Será dizimada por minhas idéas terceirizadas. Rá!

Claro, fui muito ingênuo ao falar tudo isso acima.
São as idéias que me possuem.
O que ocorreu na verdade é que uma idéia, a expressada na primeira frase, não era a favor da greve, muito menos com o diálogo com as outras idéias, e tomou conta de minha cabeça na tentativa de se impor. 
Nisso, outras idéias se uniram às idéias em greve.
Minhas idéias estão em conflito e eu apenas assisto, pois sou apenas o palco desta discussão infinita. Já estou vendo no horizonte outras idéias chegando com escudos, armas e bombas para dizimar idéias que só querem seu direito de se expressarem.


quarta-feira, 17 de junho de 2009

Cobertura da greve não tem fôlego analítico


Por Tatiane Klein em 16/6/2009
Colaboraram Lucas Rodrigues de Campos e Guilherme Balza Corrêa Netto, estudantes de Jornalismo da ECA-USP, e Bruno Mandelli e Daniela Alarcon, jornalistas formados pela ECA


"Invasão" e "confronto" estão entre as palavras centrais. O tipo de cobertura reservado à repressão dos movimentos sociais é aquele que estamos acostumados a ver: manifestantes baderneiros, pautas mostradas de forma desconexa, apoio à ação policial. Com a exceção de fotografias que desmontam a imagem de delinquência construída pelos textos – como as que estão nas primeiras páginas da Folha de S.Paulo (26/5) e do Estado de S.Paulo (10/6) –, no geral, a cobertura é manchada pelo preconceito.
Conforme observou no domingo (14/6) o ombudsman Carlos Eduardo Lins da Silva, a Folha (e o Estadão também) não notou, ou preferiu não notar, o que subjaz ao que vem sendo denominado "crise na USP". Os jornais a tacham como algo "político" e "radicalizado", e que, por sê-lo, não merece crédito ou uma leitura pausada. As reportagens caem com facilidade nesse alçapão, sem prestar atenção ao fato de que quase tudo o que se noticia sobre a USP – desde o começo do ano – tem estritamente a ver com a mobilização atual.
Para esses jornalistas, a greve dos funcionários da USP surgiu como que do nada, teve a "adesão" de professores e estudantes e, na última semana, se "radicalizou" de forma inexplicável, demandando violenta ação policial. Essa leitura estanque dos fatos faz só aprofundar a impressão de falta de consequência política entre os movimentos organizados da USP. Ninguém atentou, entretanto, para o fato de que o único confronto existente nessa conjuntura é a disputa entre projetos distintos para a universidade pública: um, dos manifestantes, que tem como foco a manutenção do caráter público e crítico da universidade, e outro, que se apega à lógica de entidades como o "mercado".
Ávidos por descobrir o grau de adesão à greve em número de unidades paradas, os jornalistas, de maneira geral, esquecem de prestar atenção às falas de estudantes, professores e funcionários nas assembléias que detalham as reivindicações. Os textos não juntam "lé com cré" e não se dispõem a tentar analisar o fenômeno fora da regra geral em que os fatos aparecem, autóctones, às vistas do leitor.

Desrespeito profundo

Sob o título "Curso para professor virou um alvo", matéria publicada no domingo (14) pelo Estadão é a única que se propõe a analisar uma das pautas de forma mais atenta. Ainda assim, o faz sem consultar sequer uma fonte contrária à implantação do Ensino à Distância, como tem sido proposto para as universidades estaduais. Na Faculdade de Educação, na Associação dos Docentes e no movimento estudantil há quem discuta cientificamente a questão e essas pessoas simplesmente não foram procuradas. Por falta de informação, a contrariedade diante da Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo) vem sendo mostrada como uma pauta ingênua e elitista, contrária à democratização do ensino superior.
Com o título "Dos 16% para o `fora Suely´", matéria também dada no Estadão (14/6) ironiza as pautas com base em um pressuposto falso: o de que, após o início da greve de professores e de estudantes, as reivindicações tenham sido alteradas ao sabor da desordem do movimento. O jornalista esqueceu de consultar a pauta unificada de reivindicações do Fórum das Seis, que congrega as entidades representativas das três universidades públicas estaduais. Ali, a pauta salarial, a readmissão do líder sindical Claudionor Brandão, a contrariedade com a Univesp nos moldes como está sendo proposta, entre outras pautas, já estavam presentes. A adição do "Fora Suely!", conforme testemunham os movimentos, deve-se à presença e ação da PM no campus.
Destaque para a pauta "política de convivência estudantil", que parece ter sido inventada pelo repórter, mas faz referência às políticas de permanência estudantil. No mais, o Estadão não se preocupou em verificar a quantas andam as políticas de permanência estudantil na universidade; de que forma a USP foi expandida (para a Zona Leste de São Paulo, por exemplo) sem ampliação de verbas; como o estatuto da USP tem sido reformado paulatinamente, sem consulta à comunidade. A Associação de Pós-Graduandos (APG), por exemplo, está impetrando um mandado de segurança contra a reitoria da USP por ilegalidades cometidas em votações do Conselho Universitário: nenhuma linha publicada sobre isso.
As reportagens também pecam por não terem consultado documento divulgado pela Associação dos Docentes sobre as perdas salariais dos professores e funcionários das universidades estaduais em comparação com a evolução da arrecadação do ICMS. De 1989 até 2009, as perdas salariais acumularam 42%. O reajuste salarial ganha mais sentido se observada essa queda em relação às arrecadações recordes do ICMS no último ano.
Se parte da comunidade uspiana hoje se insurge contra o projeto de universidade que a gestão da reitora Suely Vilela representa, isso é porque esta administração esteve marcada pelo profundo desrespeito à gestão democrática da instituição. Quando fala em democracia, a imprensa a resume ao direito de ir e vir, evitando expor a greve, os piquetes e as manifestações também como instrumentos democráticos.

O fetiche do "outro lado"

A Folha de S.Paulo, em especial, tem passado sensação de equilíbrio na cobertura mais recente da greve. No entanto, o fetiche de mostrar o "outro lado" como uma forma de supostamente produzir equilíbrio não livra a cobertura do jornal de textos bastante editorializados.
Um elemento revelador dessa orientação é a cronologia "Crise na USP já se arrasta há mais de um mês" (12/6). O texto foge da objetividade factual ao deixar de mencionar acontecimentos importantes para essa greve, como o fato de as negociações da campanha salarial entre o Cruesp (Conselho de Reitores) e o Fórum das Seis terem sido interrompidas unilateralmente pelo primeiro, no dia 25/5. Isso é o que contribuiu para acirrar os ânimos entre as categorias, e não a ocupação de parte da reitoria por um grupo de manifestantes. Tal procedimento desmonta a aura de objetividade da cobertura.
As críticas à ação policial aparentam ganhar força por conta dos ferimentos causados pela PM a um dos funcionários de Folha que trabalhavam na cobertura; e do fato de a reitora Suely ter negado, sistematicamente, entrevistas ao jornal.

Organização sindical como problema

Por que existem piquetes na USP? Esta pergunta não passou sequer perto das redações. Ora: se em qualquer indústria o direito de organização sindical e o direito constitucional à greve deve ser assegurado, e a demissão de grevistas em represália, condenada, também na universidade isso tem de acontecer. Mas as reportagens simplesmente não dão conta de quais tipos de ilegalidade a administração da USP comete contra seus grevistas: se há relatos de assédio moral, por exemplo, o leitor não sabe, nem viu.
A matéria "Líder sindical na USP já fez 12 greves e prega revolta armada", publicada pela Folha (13/6), também dá conta do viés que costura as posições do jornal sobre o sindicalismo. O destaque da manchete e da abertura da matéria para a filiação do líder sindical Claudionor Brandão a uma agremiação política que acredita na revolução armada é o signo do discurso que, subjacente ao texto, desqualifica o movimento. O texto atrela o movimento à violência da "revolta armada" e constrói a esdrúxula certeza de que uma vanguarda do movimento recorreria a armas para expulsar a PM da USP.Além disso, a reportagem parece esquecer que no Brasil, pelo menos desde 1988, há liberdade de organização política. Por certo não são expostos da mesma forma os sujeitos políticos que apoiaram o regime militar no passado.

Atitudes amenas

Ao narrar a ação repressiva da polícia na universidade, os jornais têm se valido das versões de manifestantes, reitoria e policiais, sem relatar o que muitos repórteres viram efetivamente na terça-feira (9/6). Exemplo é o destaque dado para o uso de bombas de suposto efeito "moral". O leitor que nunca esteve perto de uma das granadas de borracha usadas pela PM, não saberá que elas realmente colocam em risco a integridade física dos atingidos. A explosão de uma bomba de efeito "moral" pode causar queimaduras graves, mutilar dedos das mãos, rasgar e penetrar a carne, bem como cegar.
Na USP, a indignação contra o que aconteceu naquela terça-feira é grande e os jornais não estão nem perto de mostrar esse impacto. Dos repórteres que viram parte da comunidade uspiana ser acuada e violentada no interior de uma ambiente que se pretende autônomo, a maioria calou.